720X90
Publicidade

Isonomia: quando tratar diferente é o único jeito de fazer justiça

Por que tratar todos de forma igual pode ser injusto — e como a isonomia corrige caminhos desiguais com dignidade.
Foto: Ilustração

Caro leitor, hoje quero te fazer um pedido especial: abra seu coração e leia este texto com atenção, pensando em você ou em alguém que conheça e que já tenha vivido situações de desigualdade. Vamos exercitar, juntos, um pouco mais de empatia.

Não vou começar com conceitos difíceis nem com aquelas definições de livro de Direito. Quero, na verdade, contar uma cena real, que sempre levo comigo nas minhas palestras e que, toda vez que repito, provoca aquele silêncio que só a reflexão profunda é capaz de causar.

Peço a ajuda de duas pessoas da plateia. Podem ser dois homens, ou duas mulheres, tanto faz. O que importa é que, antes mesmo de chamá-los, eu já sei de um detalhe importante: uma dessas pessoas é diabética. Então, lá na frente, com todo mundo olhando, tiro da sacola dois pedaços generosos de chocolate — daquele que dá vontade de comer só de sentir o cheiro.

Estendo o doce para os dois, sorrindo, como quem faz um gesto de igualdade. Mas, antes mesmo de tocar no chocolate, a pessoa diabética me olha com um sorriso tímido e diz:
“Professor… obrigado… mas eu não posso. Se eu comer, posso passar mal. Pode até me matar.”

Silêncio na sala. Todo mundo entende na hora o recado: tratar os dois da mesma forma, nesse caso, não foi justo. Foi perigoso.

E é exatamente disso que estamos falando: de como a tal “igualdade” pode ser injusta quando não leva em conta as diferenças.

Em Ribeirão Branco e no restante do Brasil, a gente vê isso todos os dias. A criança com deficiência que precisa de uma rampa para entrar na escola. O jovem da periferia que precisa de uma vaga por cota racial para tentar chegar à universidade. O trabalhador rural que precisa de condições diferentes de acesso à saúde, porque o posto mais próximo está a quilômetros de distância.

Isonomia é isso: é tratar cada um conforme suas necessidades, para que todos tenham a chance de chegar ao mesmo lugar. Não é dar mais para uns e menos para outros por capricho — é dar a cada um aquilo que precisa para, só então, podermos falar em igualdade de verdade.

É entender que a deficiência não é só física: pode ser social, econômica, educacional. Que o aluno que vem da zona rural não teve as mesmas oportunidades de quem estudou em colégio particular. Que a mulher negra, a pessoa com deficiência, o indígena, o ribeirinho… todos têm histórias de luta que não cabem em estatísticas frias.

As políticas públicas que muita gente critica — como cotas, transporte adaptado, atendimento prioritário, educação especial — são formas concretas de aplicar a isonomia. Não são favores: são tentativas de corrigir um jogo que começou desigual.

Porque justiça de verdade não é colocar todo mundo na mesma linha de largada fingindo que o percurso é igual para todos. É olhar para o caminho de cada um e garantir que ninguém fique para trás só porque carrega um peso que os outros não veem.

Obrigado por me acompanhar mais uma vez, leitor. Nos encontramos na próxima edição. E, até lá, fica o convite: da próxima vez que ouvir alguém dizendo que todos devem ser tratados de forma igual, lembre do chocolate… e pense duas vezes.

Receba um abraço fraternal, na medida da sua necessidade, de um humanista e metrologista que segue acreditando na justiça que enxerga as diferenças. Até breve!

Sobre a Coluna

A coluna de Donizete Furlan será publicada semanalmente no Diário de Ribeirão Branco, sempre com textos que entrelaçam Direito, memória e cotidiano. Um convite ao pensamento crítico com raízes no interior.

© 2025 Diário de Ribeirão Branco